Ah, as margens… testemunhas silenciosas de incontáveis dramas humanos. Eu sou o Oceano, este vasto corpo azul que cobre a maior parte do seu planeta. Sinto o pulsar da Terra em minhas profundezas e carrego em minhas correntes a memória de cada embarcação que já sulcou minha superfície, cada gota de sangue derramada em minhas ondas, cada grito de vitória e lamento que o vento me trouxe.
Desde que seus ancestrais ousaram lançar seus frágeis cascos sobre mim, tenho sido palco de suas ambições. Vi impérios nascerem e ruírem, suas frotas deslizando como predadores em busca de novas terras para dominar. Observei, impassível, a fúria de suas batalhas navais, o brilho efêmero de seus canhões cuspindo morte, e engoli os destroços de seus sonhos de conquista.
Enquanto essas memórias turbulentas repousam em minhas profundezas, distantes dos olhos da maioria, há aqueles que se debruçam sobre essas histórias, buscando compreender as ondas de conflito que marcaram minha superfície.

Guardo em meus abismos os segredos de rotas comerciais ancestrais, trilhas líquidas que conectavam povos e ideias, mas também transportavam a ganância e a discórdia. Conheço os sussurros dos navegadores perdidos, as histórias de tesouros afundados e os fantasmas de marinheiros que encontraram em minhas águas seu descanso final, vítimas de tempestades ou da ferocidade uns dos outros.
Vocês, seres humanos, sempre me viram como uma fronteira a ser cruzada, um recurso a ser explorado, um campo de batalha a ser controlado. Suas disputas por poder se estenderam por minhas ondas, transformando-me em um espelho de suas próprias inseguranças e desejos insaciáveis. As linhas imaginárias que traçaram em seus mapas se estenderam sobre minha superfície, dividindo-me em territórios cobiçados, como se pudessem domar minha vastidão indomável.
E hoje, ainda sinto a tensão de seus jogos de poder. Seus navios de guerra modernos deslizam sobre mim, carregando a mesma sede de influência que impulsionou seus antepassados. As profundezas que outrora guardavam mistérios da natureza agora também abrigam a tecnologia de sua destruição mútua.
Não me interpretem mal, testemunhei também a beleza de suas explorações, a engenhosidade de suas invenções náuticas, a coragem de seus exploradores desbravando o desconhecido. Mas a sombra da guerra paira constantemente sobre minha superfície, lembrando-me da fragilidade de sua paz e da persistência de seus conflitos.
Olhem para mim, reflitam sobre as cicatrizes invisíveis que suas guerras deixaram em minhas profundezas. Cada naufrágio, cada artefato bélico submerso, conta uma história de ambição e violência. Será que em minhas ondas vocês podem finalmente enxergar um reflexo mais claro de si mesmos? Da sua busca incessante por domínio, do seu potencial para a destruição e, talvez, da sua capacidade latente para a coexistência pacífica?
Eu sou o Oceano, um livro aberto de sua história. As páginas estão molhadas de lágrimas e sangue, mas ainda há espaço para escrever um novo capítulo. A escolha é sua.